O terceiro dia (16/10) do 14º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS) começou com quatro plenárias simultâneas e debates acalorados.
Na mesa que debateu o trabalho de assistentes sociais na política de assistência social, as professoras Mavi Pacheco (UFRJ), Ivanete Boschetti (UnB) e Aldaíza Sposati (PUC-SP), e a secretária nacional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) Denise Colin, abordaram os desafios do trabalho da categoria na política, analisando se houve ou não avanços no combate à pobreza e à desigualdade no país e se o sistema de proteção social brasileiro é aquele defendido pelo projeto ético-político da profissão.
Para Mavi Pacheco, o cenário atual é o de “assistencialização” da seguridade social, haja vista o padrão de proteção social brasileiro que ela definiu como pobre e focalizado, que mesmo voltado para as camadas mais miseráveis da sociedade, não tira a classe trabalhadora da condição subalternizada e não amplia direitos.
Já a secretária nacional do MDS, Denise Colin, afirmou que há avanços na política de assistência social frente à realidade econômica, política e social brasileira, e um deles é a redução da extrema pobreza no país. Ela falou também do trabalho de assistentes sociais, que deixaram de ser operadores de programas para efetivar direitos.
Nessa mesma linha, a professora Aldaíza Sposati defendeu a política, criticando quem chama de “assistencialização” a atenção dada às camadas mais pobres. Ela abordou algumas determinações e tensões no trabalho de assistentes sociais, como o conflito entre direito e concessão, esta pela herança política liberal conservadora.
Para encerrar a mesa, a professora Ivanete Boschetti defendeu uma atuação profissional que busque a emancipação humana, mas que as disparidades salariais, a precarização dos contratos de trabalho e a desregulamentação dos direitos não asseguram o exercício profissional que o projeto ético-político aponta para a categoria.
Diversidade sexual e identidade de gênero
A plenária apontou os desafios do serviço social nesta área. O professor da UERJ Guilherme Almeida falou da questão da identidade trans, relatando algumas experiências no atendimento a pessoas que passam por um processo transexualizador. Ele fez reflexões de como as políticas sociais brasileiras vem tratando o tema, e afirmou que o serviço social precisa de mais pesquisas nesta área.
Em seguida, a conselheira do CFESS Marylucia Mesquita fez uma abordagem da heterossexualide compulsória como sistema de dominação ideológica que fundamenta as praticas opressoras de homofobia, lesbofobia e transfobia. Logo depois, ela destacou aspectos do projeto ético-politico profissional e da agenda política do Conjunto CFESS-CRESS sobre a livre orientação e expressão sexual e livre identidade de gênero. Ela falou que a prática afetivo-sexual tem duas dimensões, privada e pública, e que esta última é fundamental para o reconhecimento dos direitos humanos da população LGBT.
Para encerrar, o conselheiro do CRESS-SP Marcos Valdir abordou a potencial contribuição da categoria de assistentes sociais na afirmação da diversidade sexual e identidade de gênero, afirmando que o debate coloca o serviço social no caminho contrário à sociedade capitalista machista e homofóbica. Ele ressaltou também que é preciso fazer o enfrentamento da invisibilidade para a efetivação dos direitos.
Organização política da categoria
A plenária “A organização política dos/as assistentes sociais: em defesa do trabalho e da formação com qualidade” foi composta pela presidente do CFESS, Sâmya Ramos, pela presidente da ABEPSS, Regina Ávila, e pelo representante da ENESSO, Jodeylson de Lima.
Um dos pontos de destaque foi o entendimento da organização política da categoria, que, segundo os/as palestrantes da mesa, só tem sentido com o fortalecimento de alianças com outros sujeitos e movimentos sociais que lutam por uma sociedade anticapitalista e radicalmente democrática. Um dos aspectos ressaltados nesse sentido foi a própria aliança entre o Conjunto CFESS-CRESS, a ABEPSS e a ENESSO, o que reafirma a importância da organização política na perspectiva da defesa do projeto profissional do serviço social brasileiro.
Além disso, a mesa também abordou a questão da vinculação da organização da categoria de assistentes sociais no Brasil à luta geral dos/as trabalhadores/as, o que reafirma o projeto ético-político do serviço social como um conjunto de princípios que não se restringem à defesa somente da profissão de assistente social, mas na defesa dos direitos da classe trabalhadora, destacando o papel fundamental da formação profissional de qualidade, com base nos princípios do projeto profissional, e seu rebatimento na atuação do/a assistente social.
Por fim, um outro elemento discutido foi a organização política como mediação para o enfrentamento da precarização da formação e consequentemente das condições de trabalho. Segundo os/as palestrantes, os/as assistentes sociais precisam se organizar politicamente e se unir a outras categorias profissionais. Assim, a luta em defesa dos direitos dos/as trabalhadores/as se fortalece e ganha novos sujeitos para a luta pela afirmação de um projeto de sociedade emancipatório.
Política de drogas
Em outro auditório, o tema dos debates foi a “Política de drogas: consensos, dissensos e direitos em debate – questões para o serviço social”, que trouxe a contribuição da assistente social e professora da Universidade Federal Fluminense Cristina Brites, da juíza Maria Lucia Karan e do coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (LAPS) da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ).
Entre as questões levantadas pela mesa, estão a terceirização e privatização da saúde pública, o que rebate diretamente nas políticas de saúde e assistência social e no atendimento aos/às usuários/as. De acordo com as palestras, é preciso fortalecer a preparação da rede socioassistencial para o atendimento e a abordagem de usuários, a partir de reflexões como o significado do espaço em que é feito o uso de drogas, o histórico social do usuário e suas motivações de uso.
Também permeou o debate a internação compulsória, recentemente estimulada e colocada em prática pelo Estado brasileiro, em uma nítida política higienista de limpeza social diante dos megaeventos. Nessa perspectiva, foi analisada a intervenção de assistentes sociais, em face dos conflitos nos espaços de atuação, porém com o entendimento de que não se distingue a ética pessoal da ética profissional.
Um importante dado trazido pela mesa foi que, do ponto de vista jurídico, a internação compulsória não é legalmente obrigatória. Ela está prevista pela Reforma Psiquiátrica, porém apenas em último caso, a partir de critérios específicos, uma vez que essa estratégia, tão visibilizada pela mídia conservadora, significa uma clara violação dos direitos da população usuária.
Estrangeiros/as marcam presença no CBAS
Em meio às diversas palestras e sessões temáticas, o CFESS, representado pelas/os conselheiras/os Esther Lemos, Maurílio Matos e Alessandra Souza, realizou uma reunião com seis assistentes sociais que vieram de Luanda (Angola), para conhecer a experiência do serviço social brasileiro e socializar os desafios da profissão no país africano. Para a assistente social angolana Anavilde Kasessa, foi uma excelente oportunidade para conhecerem como a profissão está organizada no país, tendo em vista que em Angola, a experiência do serviço social é recente. “Os cursos de serviço social no nosso país foram fechados por 30 anos, então temos o desafio de buscar nosso espaço. Vamos beber da experiência brasileira para que não tenhamos que passar pelas dificuldades que o serviço social brasileiro passou”, disse Anavilde, que também elogiou a organização política da categoria no Brasil.
Ao final, o CFESS e a ABEPSS, que se juntou ao grupo durante a reunião, afirmaram que vão cooperar, abrindo mais canais de diálogos nesse intercâmbio de experiências entre Brasil e Angola, a partir do próprio compromisso das entidades no âmbito das relações internacionais.
Experiências nas Residências em Saúde
A tarde do terceiro dia de evento começou com sessões temáticas de apresentação de trabalhos e trouxe também a sessão de lançamento de pôsteres, com experiências de atuação de assistentes sociais em diversos espaços.
À noite, antes do chamado “Cine CBAS”, atividade com exibição de filmes para os/as participantes, houve a continuidade do debate sobre as Residências em Saúde. Dessa vez, o foco foram as experiências de inserção do serviço social nesse espaço, com a apresentação de experiências profissionais das assistentes sociais Letícia Batista, do Instituto Nacional de Câncer (INCA-RJ) e Thaísa Teixeira, da Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).
O terceiro dia do congresso foi encerrado com mais uma atividade cultural, que foi o Baile de Mascarados/as, com grande participação do público do evento.
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*Fonte: CFESS