Começou na segunda-feira (5) o 15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), em Olinda (PE). O evento, considerado o maior do Serviço Social brasileiro, mobiliza nesta edição ao menos 3500 pessoas, entre assistentes sociais e estudantes, para inúmeros debates sobre diversos temas que perpassam a profissão.
Em 2016 o Serviço Social brasileiro completa 80 anos de história e o mote do CBAS é: “com a certeza na frente e a história na mão”, parafraseando a música de Geraldo Vandré, “Pra não dizer que não falei das flores”.
Esta edição do CBAS está para ficar na história da profissão. A começar pelo número de participantes, um dos maiores das edições do CBAS, e que, durante a conferência de abertura, ultrapassou 4 mil pessoas, tendo em vista que foram abertas mais 1500 vagas gratuitas para este momento. Sem contar as quase mil visualizações online, já que a abertura foi também transmitida pela internet.
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Este CBAS já faz história também pela quantidade de apresentação de pôsteres de congressistas: são mais de mil trabalhos, das mais diversas áreas de atuação profissional.
Mas, talvez, o ponto alto do Congresso está nas vozes uníssonas que gritaram, gritam e gritarão: “Fora Temer!”.
O CBAS é um importante momento de organização política da categoria, e a conjuntura atual, de governo ilegítimo, intenso desmonte das políticas sociais e brutais ataques à classe trabalhadora, deve conduzir a categoria a uma unidade de luta e resistência.
Este foi o tom da mesa de abertura do CBAS, que contou com representações das entidades organizadoras do Congresso: CFESS, Cress/PE, Abepss e Enesso.
“Diante deste desmonte avassalador, afirmo: não temeremos! Como diria o cantor e compositor pernambucano Chico Science, ‘a cidade não para, a cidade só cresce, o de cima sobe e o de baixo desce’. Mas esse mesmo Chico também cantava: ‘com o bucho mais cheio comecei a pensar que eu me organizando posso desorganizar, que eu desorganizando posso me organizar, que eu me desorganizando posso me organizar’. E assim será nosso CBAS de Olinda (e Recife)”, conclamou Galba Vieira, presidenta do Cress/PE.
Em seguida, a representante da Enesso, Karoline Santos, enfatizou: “Repudiamos o grande ataque à democracia brasileira. Repudiamos os cortes na educação e em todas as outras políticas sociais. Repudiamos a criminalização dos movimentos sociais. Bradamos o ‘Fora Temer!’. Pelo Fora Temer e greve geral. A Enesso é para lutar”.
A presidenta da Abepess, Raquel Sant’Ana, encorpou o coro “Fora Temer”, destacando: “nós, assistentes sociais, vamos reforçar nossas lutas pelos direitos. Somos classe trabalhadora e temos compromisso de classe. Defendemos direitos humanos e não abrimos mão disso. Defendemos uma outra sociedade e estaremos ocupando nossos espaços, pois esse país é nosso, da classe trabalhadora!”.
Para fechar a mesa, o presidente do CFESS, Maurílio Matos, reafirmou a autonomia política do Congresso e das entidades de Serviço Social, ressaltando a importância disso para o fortalecimento do Projeto Ético-político profissional e para a luta da categoria. “Sempre tivemos coragem e autonomia para dizer não a esta contrarreforma das políticas sociais, não às privatizações, não à criminalização dos movimentos sociais. E este momento, de ampliação de retrocessos, não será diferente. Este CBAS é um espaço de resistência e luta. E temos também o dever de mostrar à população usuária, as pessoas que atendemos cotidianamente, os impactos das propostas deste governo ilegítimo. Por isso, a palavra de ordem é: sou assistente social, é fora temer e greve geral!”, enfatizou.
Conferência “80 anos do Serviço Social no Brasil”
O primeiro dia de CBAS teve também a conferência que dá o tom do evento: os 80 anos do Serviço Social no Brasil. Ana Elisabete Mota (professora da UFPE) e Marilda Iamamoto (professora da Uerj) falaram da história da profissão, dos rebatimentos da conjuntura no exercício profissional e desafios da categoria pela defesa dos direitos da classe trabalhadora.
“Presenciamos nos últimos meses a judicialização do poder, o agressivo desmonte das políticas sociais. Mas a nossa resposta á crise será: nenhum direito a menos”, disse Ana Elisabete Mota.
Segundo ela, o que houve nos últimos tempos foi a capitalização dos serviços para expropriação da classe trabalhadora. “A direita precisava concluir a sua ‘reforma liberal’ puro sangue do estado e foi isso que assistimos com esse ‘golpe’ na democracia. Sem dúvida alguma, isso já está trazendo impactos ao exercício profissional de assistentes sociais e a toda população”, analisou.
Ainda para a professora da UFPE, o momento exige da categoria o enfrentamento da agenda regressiva em “organicidade com os setores da esquerda” e, principalmente, a retomada da pedagogia das classes subalternas. “Nos últimos anos criou-se novos ‘consumidores’, mas não se criou novos sujeitos políticos. Temos que construir a pedagogia das classes subalternas, baseada na emancipação humana e justiça social”, destacou.
Para finalizar, Ana Elisabete Mota reforçou o que ela defende como papel do Serviço Social brasileiro. “Nossa profissão não se restringe mais a uma intervenção imediata e deve continuar caminhando para a insurgência contra o ‘lugar definido’. A construção do nosso Projeto Ético-político contribuiu para consolidação de ideologias e ideário marcado por princípios e valores que fundamentam e articulam a profissão e realidade. Em momentos de regressão, precisamos acumular forças e redefinir meios e modos para encontrar uma unidade de esquerda. Não devemos ceder às armadilhas das classes dominantes!”.
A professora Marilda Iamamoto reforçou a crítica ao momento que o país vive. “Se vivemos tempos intempestivos e temerários, vivemos também tempos de organização e luta. Repudiamos o golpe e a superexploração do trabalho”. Nesse sentido, segundo ela, é preciso avançar na direção de um projeto para o Brasil apoiado em uma frente de esquerda, classista e fundada na dimensão do trabalho. “Atribuir densidade à luta requer uma profissão inscrita no Brasil”, completou.
Segundo Iamamoto, o trabalho de assistentes sociais sofre uma importante pressão das necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras organizados, cujas “demandas sociais se transformam em demandas profissionais”. Assim, a possibilidade de imprimir uma direção ao exercício profissional, fundada em uma relativa autonomia, dependerá da correlação de forças nos espaços institucionais.
Ao fazer um breve histórico da profissão, Marilda relembrou a influência religiosa no Serviço Social em seus primórdios no Brasil, enfatizando a necessidade de se respeitar o caráter laico que a profissão adquiriu ao longo de sua história.
Além disso, a professora da Uerj enfatizou que assistentes sociais devem ultrapassar a leitura da população enquanto mera usuária de políticas sociais. “É hora de acumular forças nos campos teórico e político e soldar as forças progressistas. Estamos falando do retorno ao trabalho de base, da organização política das pessoas. É avançarmos na dimensão educativa, coletiva contra-hegemônica”, encerrou.
Após a conferência, houve um momento de confraternização para o público do CBAS.
Plenárias simultâneas, sessões temáticas, apresentação de pôsteres e lançamentos de livros
Já na terça-feira (6), a programação do Congresso contou com plenárias simultâneas, com os seguintes temas: A constituição do território e a (in)sustentabilidade ambiental na configuração de crise do capital; As configurações da política de saúde na atualidade e as repercussões no trabalho profissional de assistentes sociais; O serviço social no sociojurídico: requisições conservadoras e práticas de resistência; A importância dos movimentos sociais na materialização das políticas sociais: o trabalho do assistente social frente às demandas da classe trabalhadora.
Na parte da tarde, foi a vez das sessões temáticas e apresentação de pôsteres com os seguintes temas: Serviço social, Fundamentos, Formação e Trabalho Profissional: Precarização da Formação Profissional; Questões agrária, urbana, ambiental e serviço social; Política Social e Serviço Social: Reflexão crítica sobre os espaços de Controle Social; Serviço social, Relações de exploração/opressão de gênero, raça/etnia, Geração e sexualidades: Genocídio da População Negra; Envelhecimento na sociabilidade do capital; Trabalho e Formação profissional: os desafios do Estágio Supervisionado.
Ao final do dia, aconteceu a sessão de lançamento de livros, espaço clássico do CBAS para apresentação de obras na área de Serviço Social.
Serviço Social, Memórias e Resistências contra a Ditadura
Também na terça, aconteceu o lançamento da exposição Serviço Social, Memórias e Resistências contra a Ditadura, que resgata depoimentos de assistentes sociais que lutaram pela democracia durante o regime militar. Em breve, o CFESS divulgará mais informações sobre este espaço no CBAS que vem emocionando as pessoas que passam pela mostra.