CRESS Entrevista Ana Cláudia Fernandes sobre o Dia Mundial da Saúde Mental

Nesta semana em que se lembra o Dia Mundial da Saúde Mental (10/10), o CRESS Entrevista Ana Cláudia Fernandes sobre a data, a importância da Política e dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

Ana Cláudia é assistente social, especialista em Saúde Pública e Serviço Social e Serviço Social e Oncologia e é também servidora do Município de Parnamirim atuando no CAPS II.

“Na Política de Saúde Mental, a/o assistente social atua nas múltiplas expressões da questão social – o desemprego, a falta de moradia, o estigma, o preconceito, a discriminação, a pobreza, a violência, entre outros -, sendo fundamental desenvolver um trabalho intersetorial com as demais políticas públicas”, afirma a profissional.

Confira a entrevista na íntegra

CR: Com que perspectiva de saúde mental a/o assistente social atua nos CAPS?

AC: A atuação da/o assistente social nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) tem como perspectiva a garantia da efetivação dos direitos das/os usuárias/os e o acesso à Assistência e à Saúde, de acordo com a Reforma Psiquiátrica. É importante refletir que, além dos aspectos biológicos e psíquicos, os determinantes sociais interferem no processo saúde/doença, tais como: fatores sociais, econômicos, psicológicos, culturais e étnicos/raciais. 

Na Política de Saúde Mental, a/o assistente social também atua nas múltiplas expressões da questão social – o desemprego, a falta de moradia, o estigma, o preconceito, a discriminação, a pobreza, a violência, entre outros -, sendo fundamental desenvolver um trabalho intersetorial com as demais políticas públicas. 

Dessa forma, a atuação da/o assistente social nos CAPS tem como objetivo promover às/aos usuárias/os e suas famílias uma atenção e cuidado em saúde mental humanizado, proporcionando sua autonomia, reinserção psicossocial, o exercício da cidadania, inclusão social e visando a promoção da qualidade de vida dos sujeitos.

CR: Quais são os principais desafios, hoje, para que esta política pública funcione de forma efetiva, em nível nacional e em nível local?

AC: O principal desafio da Política de Saúde Mental, tanto no âmbito nacional como municipal, é, primeiramente, a reafirmação do Sistema Único de Saúde (SUS). Também temos o fortalecimento e implementação da Reforma Psiquiátrica; mais investimento visando a ampliação dos CAPS e estruturas dos serviços; melhores condições de trabalho; ampliação do acesso; integração e fortalecimento com a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), principalmente com a Atenção Básica e equipes multiprofissionais de acordo com cada porte/complexidade dos CAPS e capacitação e educação permanente dessas equipes.

CR: Quem pode ser atendida/o nos CAPS e como acessar este atendimento?

AC: Os CAPS são serviços de referência e tratamento para pessoas que necessitam de cuidado em saúde mental, com atendimento prioritário para usuárias/os com transtornos mentais severos e persistentes. São abertos e comunitários, com o funcionamento diário de acordo com cada porte ou complexidade – CAPSi, CAPS I, II, III CAPS AD e CAPS AD III Álcool e Outras Drogas. As unidades são compostas por equipes multiprofissionais, de acordo com a Portaria nº 336/2002.

Por ser um serviço de saúde aberto, qualquer pessoa pode procurar uma unidade do CAPS dentro do seu território, não necessitando de encaminhamento ou regulação de outro serviço. Ao chegar à unidade, independentemente de ter ou não encaminhamento, a/o usuária/o é acolhida/o por um/a técnico/a responsável que, após escuta qualificada, definirá, junto com a equipe multiprofissional, a/o própria/o usuária/o e sua família ou cuidador/a, o projeto terapêutico singular de tratamento/acompanhamento no serviço.

CR: De uma maneira geral, como a conjuntura política e econômica, além da pandemia, afetaram e ainda afetam a saúde mental da população brasileira?

AC: É importante refletir que a conjuntura política e econômica do Brasil interfere na gestão, no orçamento e no financiamento das políticas públicas, bem como na sua privatização, descentralização e focalização das políticas sociais, produzindo as diversas expressões da questão social, sendo reflexo do modo de produção capitalista e a ideologia neoliberal. A pobreza, discriminação, exclusão social, o preconceito e o não acesso aos direitos sociais, como educação, moradia, saúde, trabalho, habitação, entre outros, são fatores cruciais que afetam o adoecimento mental da população.

A pandemia da Covid-19 não apenas agravou as crises econômica, social, política, ambiental e sanitária, como intensificou ainda mais as desigualdades sociais. A população viveu momentos difíceis de incertezas sobre o futuro, do medo do contágio, de isolamento social, das mortes dos familiares e do luto não vivido, eventos cujos efeitos impactaram, especialmente, a parcela mais vulnerável da população. A doença chegou como uma avalanche, e o descaso do governo da época em relação à questão de saúde pública agravou os problemas, considerando que os trabalhos foram planejados e desenvolvidos para suprir as necessidades do momento, não atentando para os impactos que foram desencadeados ao longo da pandemia e como consequência dela.

Com o isolamento social, o fechamento do comércio e outros setores de serviços, a população foi obrigada a ficar em casa. Muitos perderam seus empregos, por vezes a única fonte de renda da família, e os índices de violência doméstica aumentaram. Hoje, há um aumento da demanda de cuidados em saúde mental, com pessoas apresentando quadros de ansiedade e depressão devido aos impactos e sequelas da doença. Se tivemos uma pandemia da Covid-19, hoje estamos vivenciando um aumento do adoecimento mental da população. 

É importante pensar que estamos em uma nova conjuntura e desde 2016 não havia nenhum reforço no custeio em relação à Política de Saúde Mental: não houve aumento dos recursos financeiros, ampliação ou expansão dos serviços CAPS, aumento das equipes multiprofissionais ou mesmo capacitação e educação permanente destas/es profissionais. Isto é reflexo do capitalismo e das políticas neoliberais, do sucateamento das políticas públicas, do desfinanciamento, da transferência de responsabilidade do Estado para o terceiro setor, das condições precárias de trabalho, do aumento da demanda e redução da equipe técnica – às vezes não se tem nem a equipe mínima exigida pela Portaria nº 336/2001.  

Essas situações influenciam o adoecimento das/os profissionais que trabalham na atenção psicossocial, principalmente nos CAPS, evidenciando que não existe um cuidado com quem cuida das pessoas que necessitam de tratamento em saúde mental. 

Durante a 17° Conferência Nacional de Saúde (CNS) realizada em Brasília (DF), neste ano, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, informou que ampliou o orçamento destinado à Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) com investimento de mais R$ 200 milhões para este ano, podendo o aumento chegar até 27%. O repasse será destinado aos CAPS e Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT). Essa iniciativa tem como objetivo a reconstrução da Política de Saúde Mental e da retomada do fortalecimento da rede.

Enquanto assistentes sociais e trabalhadoras/es do SUS, precisamos lutar para que se efetive o direito à Saúde, posto na nossa Carta Magna: “Art. 196.: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

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