CRESS Entrevista Josi Soares sobre o Dia da Consciência Negra

No mês da Consciência Negra, o CRESS Entrevista Josiane Soares, presidenta do Conselho Federal de Serviço Social. Negra, vivendo no Nordeste há anos, assistente social e professora, ela está à frente da campanha de gestão do Conjunto CFESS-CRESS deste triênio: “Assistentes sociais no combate ao racismo”.

Josi, como é chamada, falou sobre a importância e os frutos colhidos com a campanha, o desafio de estar na direção de uma categoria profissional na atual conjuntura e sobre o racismo histórico no Brasil.

“O mito da democracia racial silenciou muito de nossa consciência sobre a questão, camuflada sob o manto da ‘mestiçagem’. Entretanto, nos últimos anos tem sido impraticável manter esse mito ante o Estado de guerra instaurado no Brasil, que possui critérios bastante nítidos para escolher quem matar, encarcerar e manter sob permanente segregação espacial”, afirma.

Sobre Josi

Doutora em Serviço Social, é professora associada do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Foi presidenta do CRESS daquele estado; participou da Diretoria da ABEPSS; compôs a gestão 2014-2017 do CFESS e hoje preside a atual gestão da entidade (2017-2020). Desenvolve pesquisas na área de Serviço Social e da questão ambiental vinculadas ao Grupo de Estudos e Pesquisas Marxistas (GEPEM/UFS).

Confira a entrevista:

CR: Como você avalia a importância de o Conjunto CFESS-CRESS eleger o combate ao racismo uma prioridade, transformando-o em campanha de gestão?

JS: A campanha “Assistentes sociais no combate ao racismo” foi uma das ações mais importantes do triênio, principalmente por ter sido incorporada como prioridade não apenas pelo CFESS, mas também por todos os Conselhos Regionais. Essa deliberação foi bem importante, inclusive porque mostra como as/os assistentes sociais estão em plena sintonia com diversas iniciativas de combate ao preconceito e numa hora em que o tema do racismo adquire ares de política de Estado com suas medidas de genocídio da população negra e pobres, especialmente nas periferias dos centros urbanos.

CR: Que balanço você faz dos resultados da campanha até agora e qual a expectativa para as próximas etapas?

JS: Estamos em fase de consolidação dos dados da campanha para organizá-los numa publicação que possa servir de registro histórico dessas ações para assistentes sociais e outras organizações parceiras. Entretanto, já podemos afirmar que a campanha teve muito impacto no diálogo com a categoria e também com a sociedade. As peças produzidas denunciaram, com fotos e dados para reflexão, algumas das mais frequentes expressões do racismo e foram muito bem recebidas pelo movimento negro organizado, com quem buscamos fazer ações conjuntas nesse período. 

Entendemos ter obtido êxito em passar a mensagem de que assistentes sociais no Brasil são aliadas/os no combate ao racismo e esperamos que a população usuária dos serviços com os quais trabalhamos nos reconheça nesse “lugar”. A campanha, como tal, se encerra com as nossas gestões em maio de 2020, sem que isso signifique, entretanto, que a pauta de combate ao racismo será secundarizada a partir de então, já que o “saldo” da campanha para nossa prática política é, sem dúvida, um ganho permanente.

CR: Como você avalia a organização do movimento negro no Brasil, hoje?

JS: Eu não sou a melhor pessoa para esboçar essa avaliação, já que não possuo vinculação orgânica com o movimento negro unificado no país. Tenho algumas impressões, mas não me sinto à vontade para expô-las aqui. O que conheci, inclusive a partir dos contatos para as atividades da campanha de gestão, é que existem diversas correntes e entidades que organizam segmentos das lutas antrracistas no Brasil e chega a ser arriscado falar em “movimento negro” no singular, tamanhas são as polêmicas internas relacionadas às diferenças que existem na leitura da questão racial e das estratégias para seu enfrentamento.

CR: Por que há tanto racismo e tanta gente repetindo que não existe racismo no Brasil?

JS: Porque o mito da democracia racial silenciou muito de nossa consciência sobre a questão, camuflada sob o manto da “mestiçagem”. Entretanto, nos últimos anos tem sido impraticável manter esse mito ante o Estado de guerra instaurado no Brasil, que possui critérios bastante nítidos para escolher quem matar, encarcerar e manter sob permanente segregação espacial. Isso tem ampliado as vozes pretas que denunciam essa situação de desigualdade de modo que soa absolutamente falso afirmar a inexistência de racismo no Brasil e, ao mesmo tempo, denuncia o “lugar de fala” dessas/es que assim se portam: o lugar da/o opressor/a.

CR: Como é, para você, ser mulher e negra e estar na direção de uma categoria profissional nesta conjuntura?

JS: Numa palavra: desafiador. A conjuntura nos “assalta” o ânimo todos os dias e sinto que ser mulher negra tem me ajudado a resistir. Resistir pela força herdada da ancestralidade que me forja. Somos muitas, em todos os lugares, e nos reconhecemos na força cotidiana para existir, das atividades mais banais às mais complexas, como coordenar a gestão de uma entidade nacional e importante como o CFESS. Tem sido bonito ouvir depoimentos de minhas companheiras mulheres negras nos espaços de organização do Serviço Social se reconhecendo e se sentindo representadas por essa gestão nas ações que estamos desenvolvendo. Isso é indescritível.

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